13 de agosto de 2008

(des)acordo ortográfico ?

Como nuvem densa e escura, perfilando-se ameaçadoramente no horizonte, vemos aproximar-se a passos largos do dia da adopção integral do acordo ortográfico luso-brasileiro. Dentro de seis anos, a nuvem cobrirá totalmente este pequeno país, pátria de Camões e de muitos escritores que, ao longo de alguns séculos, souberam mostrar e preservar toda a beleza, expressividade e riqueza da língua do nosso país.

Embora eu esteja a falar contra, (pelo menos) uns 200 milhões de lusófonos, acho duvidoso, imbecil, ilógico, ofensivo e até obsceno, obrigar um povo, de longa história, de raízes profundas, a alterar a sua maneira de escrever e falar, a tal ponto que muitas vezes suprime a própria indicação da raiz da palavra ! Etimologia ? O que é isso ? Não... Eles (os brasileiros) não sabem.

Mas vejamos o porquê da minha dúvida na assinatura desse acordo : Em 1500, os portugueses descobriram o Brasil. A população usava para comunicar, uma linguagem própria que nada tem a ver com a língua portuguesa. Os colonizadores portugueses, através da necessidade de comunicação com os autóctones, 'doaram' aos naturais da terra uma língua rica, nobre e bem estruturada, que se estava expandindo pelo mundo civilizado e não só, e que passou a ser a língua oficial do país. Até aqui, tudo está dentro dos parâmetros da mais básica lógica e civilidade. O mesmo aconteceu com outros países, na época da colonização. Veja-se o caso da língua inglesa  que, hoje em dia, é considerada e usada como linguagem universal.

Mas... Conhecendo um pouco da mentalidade dos brasileiros, verificamos que são um povo dotado de uma mentalidade eminentemente prática e voltada para a simplicidade na resolução dos problemas (o que considero características muito positivas). A partir daí, surgiu expontâneamente uma simplificação e personalização da linguagem, que incluiu a personalização de todos os vocábulos estrangeiros, que são usados internacionalmente, nomeadamente no domínio da técnica e da informática. Sendo esta acção absolutamente liberalizada, pois ainda hoje não existem, lá, regras próprias que regulamentem o uso da linguagem, acabou por se criar uma linguagem popular, em que uma das característica é a de aglutinar indiscriminadamente palavras estrangeiras, devidamente adaptadas. E por vezes tornadas irreconhecíveis ! Por outro lado surgiu a tendência de escrever 'como se pronuncia'. Claro que não estou a falar da população de alta cultura ou posição social destacada da massa popular como por exemplo alguns grandes escritores, até muito conhecidos e lidos em Portugal e alguns políticos e intelectuais.

Mas... Este acordo até nem seria necessário se fosse criada uma gramática e uma língua brasileiras. Cada qual com as suas regras e 'o povo' na generalidade ficaria satisfeito ou indiferente mas nunca contrariado.Mas tal não aconteceu e pelos vistos não acontecerá. (E estamos a falar de dois países ditos democráticos em que o povo é suposto mandar...)

Porquê ? Será que os brasileiros não querem largar mão do nome de uma linguagem com regras, nobre e muito antiga, portanto um bem ou mais valia cultural ? Ou será que os portugueses não querem perder pontos nos dados estatísticas sobre a expansão da lingua ? Assim são 'só' mais cerca de 200 milhões de 'lusófonos'. Certamente não será por motivos de ordem técnica pois bastaria usar toda a nossa regulamentação linguística e apenas fazer as alterações e adaptações necessárias.

Seja como for, a minha dúvida persiste : Será lícito, razoável, honesto ou lógico que depois de exportarmos a nossa bela e cuidada linguagem, venhamos agora (re)importar uma linguagem sem regras, sujeita a confusões e com expressões idiomáticas estranhas ? Enfim...Uma caricatura da verdadeira língua portuguesa. Sabemos que o acordo ortográfico apenas altera a grafia de certas palavras. Mas o que todos sabemos é que nos dias que correm, muitas expressões (algumas bastante estranhas) e muitos erros de sintaxe, têm sido importados, sucessivamente, muitas vezes a partir de certos 'jornalistas' que se sentem na necessidade de 'falar caro'. Claro que estes nem só se servem de 'brasileirismos' mas também de... burrismos. Achas que não ? Então vê lá esta :

"As acessibilidades ainda não estão prontas"
O que é que esta frase tem de errado ? Perante a maneira actual (e estranha) como os jornalistas, hoje em dia, falam, vais dizer que a frase está correcta. Mas... A terminação '***idade entrou na moda. Os substantivos desapareceram. Tornaram-se todos advérbios. Com efeito, acessibilidade, significa a capacidade de se ter acesso a qualquer coisa ou lugar. Pelos acessos. Caminhamos pelo acesso ao estádio. Se o estádio tem bons acessos, então tem boa acessibilidade. Os ***icismos tambem estão em alta. Alguns ininteligíveis à primeira, mas quase todos absolutamente deslocados no contexto da frase.

E para terminar, deixo um apontamento retirado de um email que recebi, sobre este assunto :

De fato, este meu ato refere-se à não aceitação deste pato com vista a assassinar a Língua Portuguesa. Por isso ... por não aceitar este pato ... também não vou aceitar ir a esse almoço para comer um arroz de pato ... A esta ora está úmido lá fora ... por isso, de fato lá terei hoje de vestir um fato ...

Será este o 'português' que os nossos filhos irão falar ???

E será que os ingleses farão algum dia um acordo ortográfico com os norte americanos ?